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terça-feira, 19 de julho de 2011

Lei Antifumo não vale nas cadeias, e carcereiros e presos não-fumantes têm de conviver com fumaça

Enquanto o povo paulista "livre" completará em agosto dois anos sob as regras da Lei Antifumo, o sistema penitenciário de São Paulo segue alheio às restrições ao cigarro e, ao contrário do que ocorre nos restaurantes e demais estabelecimentos fechados, continua a colocar em risco a saúde dos chamados fumantes passivos. Tanto os presos não-fumantes como os cerca de 30 mil agentes penitenciários são constantemente submetidos à convivência com uma população carcerária de 170 mil indivíduos que abriga fumantes “compulsivos", já que uma resolução do governo estadual isentou os presos de seguir a nova legislação (os carcereiros, por sua vez, hoje só podem fumar em ambientes abertos).

Mapa do tabaco no Brasil

  • Fonte: ACT
“Imagine um ambiente apertado, sem ventilação, com 30, 40 homens sem ter o que fazer e que fumam para passar o tempo. Eles fumam muito. Compulsivamente. É uma fumaceira tão grande, mas tão grande, que a gente, algumas vezes, tem dificuldade de visualizar o interior da cela”, afirma Daniel Grandolfo, diretor do Sindicato dos Agentes de Segurança Penitenciária do Estado de São Paulo (Sindasp).

Segundo ele, que não consome cigarros e trabalha na penitenciária Wellington Rodrigo Segura, em Presidente Prudente, interior do Estado, a “contaminação” tem início logo de manhã, quando é feita a contagem dos detentos. “Eu já começo a ‘fumar’ logo às 8h. Eles tomam café naquele ambiente. E a fumaça vai direto para a gaiola que ficamos. Não tem jeito”, diz ele.

No final do turno, assim como acontecia com os paulistas que freqüentavam ambientes fechados antes da Lei Antifumo, a prova da má qualidade do ar fica impregnada nas roupas. “Quando eu chego em casa, minha camisa está pura ‘carniça’. Vou direto para o banho. A vida do agente está sendo comprometida”, argumenta o carcereiro, dizendo já ter feito reivindicações, via sindicato, às autoridades paulistas – todas sem resposta.


Presos não-fumantes

 

Ao lado dos agentes penitenciários, sofrem os presos não-fumantes. Segundo a Secretaria de Administração Penitenciária (SAP), não há dados que apontem em quantos eles são no Estado. O órgão afirma que “as direções de unidades prisionais têm destinado celas para presos não fumantes”, mas não informa em quais presídios nem fornece outros números sobre a suposta segregação.

De toda forma, o próprio sindicato, além de entidades que atuam nas penitenciárias, negam que essa separação seja uma política generalizada. “Entro em presídios mais de uma vez por semana. E nunca vi cela em separado para não-fumantes”, afirma Haeidi Cerneka, da coordenação nacional da Pastoral Carcerária. “Isso não existe”, complementa Grandolfo, do Sindasp.

Na prisão, a situação é agravada por peculiaridades do sistema prisional. Como os maços são culturalmente uma moeda de troca na cadeia, o volume de cigarros que entra e sai é sempre grande.

Características dos grupos que dominam as cadeias também têm influência no quadro. “O PCC, por exemplo, proíbe o consumo de crack na prisão. Então o viciado que entra, para suportar a ‘fissura’, fuma cigarro um atrás do outro”, explica José de Jesus Filho, assessor jurídico da Pastoral Carcerária.

Além disso, como acontece na penitenciária Wellington Rodrigo Segura, em Presidente Prudente, os membros da chamada Seita Satânica consomem charutos feitos de fumo de corda em seus rituais. “A fumaça que eles produzem é grossa e forte”, diz Grandolfo, do Sindasp.


Posição oficial 

 

Procurada e solicitada a agendar uma entrevista com alguma autoridade sobre o tema, a SAP afirmou que “a pauta está prejudicada, uma vez que não possuímos dados estatísticos sobre o assunto”. O órgão, alegando questões de segurança, não autorizou a entrada do repórter em prisões do Estado.
A SAP informou que está fazendo, a pedido do UOL Notícias, um levantamento sobre a incidência de problemas pulmonares em presos. De toda forma, anunciou que não há data para término da pesquisa, que será publicada assim que repassada ao repórter.

Já a Secretaria Estadual de Saúde, uma das pastas responsáveis pela implementação e discussão da Lei Antifumo, informou que “as prisões têm administração própria e que, por isso, não têm de cumprir a lei, assim como consta na lei”.

Apesar de questionada, a secretaria não entrou no mérito da possível ameaça da liberação do fumo à saúde dos presos não-fumantes e carcereiros.


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Restrições ao cigarro nas cadeias paulistas esbarram em questões práticas, diz especialista

Para especialistas, a liberação ao cigarro dentro das celas esbarra em questões práticas e ainda precisa ser discutida. A principal alegação dos consultores ouvidos é a de que a situação dos carcereiros e dos presos não fumantes vai de encontro ao discurso das autoridades paulistas, já que a Lei Antifumo tem como um dos motes preservar o pulmão dos chamados fumantes passivos.

Segundo um texto publicado no portal da Lei Antifumo, mantido pelo governo de São Paulo, a nova regra “visa defender a saúde, principalmente, das pessoas que não fumam”. A página virtual afirma ainda que o “fumo passivo é um grave problema de saúde pública”, tido como a “terceira causa de morte evitável no mundo", e que “não existem níveis seguros de inalação de fumaça de cigarros”.

Mapa do tabaco no Brasil

  • Fonte: ACT
Na visão do cientista político Guaracy Mingardi, especialista em Segurança Pública e membro do Fórum Nacional de Segurança Pública, a questão é menos jurídica e mais prática. “Há um medo das conseqüências de uma medida desse tipo. Há risco de rebeliões. Se você corta o cigarro de uma pessoa qualquer, ela fica hiperativa, nervosa, entra em parafuso. Imagine isso num sistema penitenciário”, afirma ele, citando ainda que a restrição acabaria com a “moeda de troca” dos presos, o que também traria descontentamento em massa.
De toda forma, ele não acredita que o governo conseguiria incluir os presídios nas regras da Lei Antifumo.

“Se restringe a entrada de alguma coisa na cadeia? A cocaína entra, a maconha entra. Do jeito que a administração penitenciária está organizada, não consegue impedir nada”, diz. “Quem manda na cadeia? São as organizações criminosas.”

Para o advogado Mauricio Silva Leite, presidente da comissão de Estudos sobre Cumprimento de Pena da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP), o governo deveria criar formas de atacar o quadro. “Há uma imposição de segurança básica, uma situação incontornável: os carcereiros e os presos precisam conviver no mesmo ambiente. E, no espírito da lei, eles não têm obrigação de manter contato com o tabaco”, afirma.
Como argumenta o advogado, caberia ao Estado zelar também pela saúde dos presos, que estão temporariamente sob sua responsabilidade. “Poderiam, ao menos, disponibilizar um tratamento em massa para quem pretende largar o cigarro. A ressocialização passa por fazer o preso largar seus vícios”, diz.

Segundo ele, apesar de o governo justificar a exceção afirmando que as cadeias possuem normas especiais, não há nenhuma autorização expressa na legislação que libere o consumo de cigarro na cadeia. “O Estado, dentro de sua competência, tem capacidade de legislar de forma administrativa, mas nunca indo contra a Lei de Execução Penal. Eu não encontro nenhum fundamento que autorize e que obrigue o governo a permitir que o preso fume. Poderia ser totalmente implantada a proibição.”

Conselheiro da OAB-SP e representante da entidade junto Conselho Nacional de Justiça, o advogado Marcelo Sampaio Soares acha que os presos poderiam até receber um tratamento “diferenciado” por já estarem com outras liberdade cerceadas, mas diz ser “legítima” a alegação do sindicato dos agentes penitenciários. “É preciso, sim, discutir melhor essa questão. Talvez um caminho seria criar um sistema de zonas especiais para o consumo do tabaco e separar as áreas de fumantes e não fumantes”, complementa.

fonte: http://noticias.uol.com.br/cotidiano/2011/07/15/especialistas-apoiam-restricoes-ao-cigarro-nas-cadeias-mas-julgam-a-medida-complexa.jhtm

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